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- Eis um haicaísta
Haicais do Sol e Estação Natureza, de Dílson Lages Monteiro (*)Hildeberto Barbosa Filho Hildeberto Barbosa Filho Eis um haicaísta! O haicai virou modismo no território da poesia brasileira contemporânea. Talvez pela aparente e enganosa facilidade de juntar três versos, livres e brancos, ou mesmo em redondilha maior e menor, rimados, conforme certos padrões estéticos, muitos poetas se acham no direito de cultivá-lo E cultivá-lo irresponsavelmente… Nesta seara, e até aonde posso ter acesso, percebo que uma das leis da dialética, aquela que diz que a quantidade, em dadas circunstâncias, se transforma em qualidade, não se consuma no seu lógico desiderato. A maioria dos ditos haicaístas não fazem, de fato, o haicai, simplesmente porque não fazem, de fato, a poesia. Não obstante, existem as exceções que confirmam a regra, ao mesmo tempo em que comprovam que é possível, sim, fazer o haicai com vigor poético e dentro da antiga e legítima tradição oriental. Haicais do sol (2023) e Estação da natureza (2024), de Dilson Lages Monteiro, ambos publicados em Teresina (PI), pela Nova Aliança e Entretextos, respectivamente, exemplificam, a contento, a minha afirmação, observados os instrumentos técnicos e os motivos característicos desta singular forma poética. Os títulos já me chamam a atenção, na sua força catafórica, para o elemento primordial da natureza, presente na ampla maioria das peças líricas coletadas, e, por outro lado, para a maneira com que este elemento nuclear e fundante se deixa explorar na grandeza e na harmonia de sua alteridade. Vou dar um primeiro exemplo, retirado de Haicais do sol: Gaivota no ar, se não fosse pássaro, seria nuvem. A imagem, ingrediente intrínseco ao haicai, na sua fulminante iluminação reveladora, cristaliza o olhar do poeta, deflagrando, no leitor, sensações e pensamentos originais. O quadro paisagístico aí descrito, ou mais sugerido que descrito, parece alterar nossa percepção, na medida em que sinaliza para a possibilidade de fusão dos reinos naturais. Para a possibilidade de a gaivota ser nuvem e a nuvem ser gaivota. Fenomenologia típica da linguagem poética. A Uma amostra, como esta, pressupõe aquela “leitura silenciosa, visual e mental a um só tempo”, de que fala Massaud Moisés, no seu Dicionário de termos literários. Aqui, uma significação súbita e instantânea pode desencadear percepções novas, associações semânticas inesperadas, experiências epifânicas que nos elastecem o tecido da sensibilidade e da imaginação. O voo das abelhas Girando, girando na flor Desfolhou o cheiro. O fio da tristeza Da coruja com frio Calou a noite. Nas correntezas Peixinhos de prata Espelhos do céu. Eis mais alguns haicais que dão o tom e a perspectiva desta coletânea. Assegura R. H. Blyth, respeitável estudioso inglês, citado por George Sica, em O vazio e a beleza (2017), que o haicai “é a expressão de uma iluminação passageira, durante a qual vemos na vida das coisas”. Exatamente isto. “Vemos na vida das coisas”! Ou seja, as coisas, na representação do haicai, revelam-se elas mesmas, na sua vida própria, na sua textura insubstituível, destituídas das intenções, dos afetos, das projeções de quem as vê e as nomeia no plano verbal. No haicai e, por extensão, na verdadeira poesia, as coisas têm vida. Têm verdade, têm dignidade, têm beleza. Por isto mesmo o haicai me parece comprometido com a máxima simplicidade. A depuração dos ornamentos retóricos, dos excessos simbólicos, dos atavios figurativos, entre outros aspectos, compõem a sua estrutura descritiva, sua intuição filosófica, seu idioma despojado e cheio de irradiações significativas. Sobretudo, daquelas que tendem à “humanização da natureza e a naturalização do ser”, nas sábias palavras do autor de A criação literária. De Estação Natureza, transcrevo o segundo haicai da coletânea, para justificar o meu raciocínio: Diamante dágua Parado na folha - Sol de prata. Dilson Lages Monteiro, com estes dois livros de haicais, foge ao lugar comum dos que praticam o gênero nipônico, já adaptado, a essas alturas, à sensibilidade brasileira na pena de alguns poetas excepcionais, sem a vocação e o talento necessários à composição de forma tão difícil e peculiar. Ora descritivos, ora filosóficos, ora líricos, ora coloquiais, seus haicais trazem os reinos da fauna e da flora para ocuparem os campos da linguagem verbal, convertendo seus predicados intrínsecos em legítimos produtos estéticos. À guisa de conclusão, lembro que Dilson Lages Monteiro, piauiense de Barras do Marataoã, não é nenhum estreante. Poeta, ficcionista, ensaísta, Professor de Linguagens há três décadas, membro da APL - Academia Piauiense de Letras, é autor de uma obra literária reconhecida e consagrada, da qual os títulos, aqui comentados, constituem testemunho irrefutável. (*)Hildeberto Barbosa Filho, da Academia Paraibana de Letras.
- ALMANAQUE DA HISTÓRIA DE BARRAS: José Pires Ferreira e a vida rural de Barras do Marataoã em anúncio de 1888.
[Dílson Lages Monteiro, da Academia Piauiense de Letras, curador do Museu Virtual de Barras do Marataoã] Aos srs. collectores da Parnahyba, Campo-maior e Barras. Communico que vendi os mengados (ferro, signal e carimbo) existentes nas fazendas: Vermelha, ao capm. Bernardo Borges Leal, Tucaia e Marathoan, ao capm. Mariano Gil Castello Branco, Olho d’agua e Cabeceiras, ao capm. José de Souza Pires e Morro, ao alferes Manoel Lopes Castello Branco.Barras, 10 de Abril de 1888.José Pires Ferreira A reforma, 23.04.1888 O ano é 1888. O Brasil, especialmente o sertão nordestino, traduz-se a partir da forte presença da aristocracia rural, com predominância da pecuária como base econômica e uma estrutura de pouca mobilidade social, rígida em sua organização: hierárquica, militarizada (oficial e extraoficialmente) e patrimonialista. Nesse contexto, os meios impressos figuram como principal forma de divulgação pública. Em linguagem cerimoniosa, o anúncio acima, de caráter oficial e administrativo, informa aos arrecadadores do Império que o fazendeiro José Pires Ferreira Neto vendeu os seus "mengados" (ferro, sinal e carimbo, aqui funcionando para designar as próprias reses bovinas), em várias fazendas dele. Os novos proprietários do gado (todos de patentes militares: "capitães" e "alferes") e as respectivas fazendas em que se encontram (em Parnaíba, Campo Maior e Barras) são assim enumerados: Fazenda Vermelha → Capitão Bernardo Borges Leal Tucaia e Marathaoan → Capitão Mariano Gil Castello Branco Olho d'Água e Cabaceiras → Capitão José de Souza Pires Morro → Alferes Manoel Lopes Castello Branco Na estrutura agrária do século XIX, as “marcas de ferro, sinal e carimbo” funcionam, numa sociedade em que a pecuária era a principal atividade econômica, como forma de identificar o gado e provar a propriedade. Observa-se, ainda, a partir do anúncio, que havia obrigações fiscais a cumprir e que a presença do estado Luso-Brasileiro ocorria, entre outros fatores, por meio de coletores. Eles, além de recolherem impostos, faziam registros administrativos, o que demonstra o controle da Monarquia sobre a atividade rural. Todos os gados de propriedade de José Pires Ferreira Neto nas fazendas referidas são comercializados em um ano emblemático, o ano da libertação dos afrodescendentes escravizados (Lei Áurea), 1888. Como a mão de obra nas fazendas de gado se constituía por vaqueiros livres ou colonos empobrecidos, esse parece não ser o fator determinante da venda. Nesse ano, constava o fazendeiro a idade de 76 anos e o provável é que tenha ocorrido por questões sucessórias, econômicas ou pessoais. José Pires Ferreira Neto José Pires Ferreira Neto ( 1812 -1908) no Rio de Janeiro, com 94 anos Segundo Edgardo Pires Ferreira (1), José Pires Ferreira Neto, um dos patriarcas da família Pires Ferreira de Barras do Marataoã, nasceu em “16.08.1812 no sítio (fazenda) de Santa Cruz das Pedras Preguiças, no município de Barreirinhas, no Maranhão, e + 03.06.1908 no Rio de Janeiro, com 94 anos, à rua Pedro Ivo, 36, sendo sepultado no Cemitério de São Francisco Xavier. (...) Casou-se em primeiras núpcias em 1833 no município de Barras com MARIA JOAQUINA DE JESUS CASTELLO BRANCO CARVALHO DE ALMEIDA, n. em Barras, e + 20.02.1856 em Barras, quando do nascimento de seu filho Antônio”. Registra ainda Edgardo Pires Ferreira que José Pires Ferreira se casaria mais três vezes “(...) em segundas núpcias em 1858 no Brejo dos Anapurús com UMBELINA ANTONIA DE LIMA CASTELLO BRANCO, n. no Brejo dos Anapurús, no Maranhão, e + antes de 1878 em Barras. (...) e em terceiras núpcias, em 24.06.1878, na fazenda Olho D'água dos Pires, no município de Barras, hoje Esperantina, com sua prima legítima ADELAIDE ROSA DE CARVALHO CASTELLO BRANCO, n. 02.07.1842 no lugar Satisfeito, no município de Barras, e + em 1883 no Olho d´Água dos Pires. (...) .. e em quartas núpcias, em 1884, com ROSA LINA DO REGO CASTELLO BRANCO, n. 1867 na fazenda Jatobá, na "Chapada da Limpeza", no município de Barras, hoje Esperantina, e + em Luzilândia.” SAIBA MAIS sobre José Pires Ferreira Neto na plataforma de genealogia Parentesco . O ANÚNCIO A reforma, 23.04.1888 (1) FERREIRA, Edgardo Pires. A mística do parentesco - uma genealogia inacabada. Volume 2: Piauí, Rio de Janeiro. São Paulo: Corrêa do Lago, 1992.
- A pergunta de Junho: "Um homem da lei e da arte. Quem sou eu? Qual o meu legado?"
Registro fotográfico publicado em A Luta, em 1952. Ele nasceu em Barras do Marataoã ,em 1887, e faleceu em Teresina, em 1963. Em sua cidade natal, chegou a dedicar-se ao magistério nas primeiras décadas do século XX, quando ali exercia a magistratura. Barras era pequena para seus sonhos e projetos. Ele construiria fora de sua cidade natal uma bonita trajetória jurídica, docente e literária. Teve intensa participação na imprensa local, no século XX, e ocupou cadeira no órgão máximo das letras no Piauí, a Academia Piauiense de Letras. Como homem das leis, chegaria ao posto máximo do Judiciário estadual, desembargador do Tribunal de Justiça do Piauí. Escreveu poemas e livros jurídicos. Quem é essa notável figura? Qual o seu legado?
- Relembrando Lucílio de Albuquerque
*José Fernandes do Rêgo Mãe Preta , 1912, de Lucílio de Albuquerque (n.Barras do Marataoã, 1877, f. no Rio de Janeiro,1939) Ao ensejo do transcurso de mais um aniversário da morte de Lucílio de Albuquerque, ocorrida a 19 de abril de 1939, numerosos amigos reuniram-se na residência do grande pintor para homenagear sua memória e, também, para expressar sua simpatia à dona Georgina de Albuquerque, viúva do grande artista, companheira admirável de toda sua existência e inspiradora de uma das suas telas mais famosas, conhecida como o “Retrato de Georgina”. Durante a reunião, tivemos oportunidade de percorrer a maioria dos trabalhos que lhe valeram merecido renome internacional e que tanto contribuíram para salientar, nos meios artísticos e culturais, o nome de Parnaíba, e o do seu berço. Por isto, não podemos deixar de assinalar, de passagem, a ausência do bancada do Piauí e de outras autoridades do Estado num momento em que era prestado tributo de afirmação a um dos mais eminentes filhos da velha província nordestina. A paisagem física e cultural do Nordeste, é bem verdade, pouca influência teve na vida e na obra de Lucílio de Albuquerque. Os temas patrióticos estão presentes em numerosos dos seus trabalhos, como a “Anchieta escrevendo à Virgem” ou “Execução à Luzerna”, mas a região de seus nascimentos contribuiu, apenas, para a tela em que retratou a Matriz da Virgem da Conceição, de Barras, por ele idealizada à referida região , e “Mãe Preta” e a composição belíssima em que representava Iracema, o que, é do nosso entender, um dos seus mais extraordinários trabalhos. Sabe-se bem, que apesar da educação longe do Piauí, dos viagens à Europa, que tanta repercussão tiveram na sua carreira, Lucílio de Albuquerque nunca esqueceu a terra de seus ancestrais, como o demonstra a dedicação filial com que pinta a tela em que evoca a matriz da Padroeira de Barras, terra de seu nascimento , a qual já nos reportamos. É forçoso de triste ver um país, mesmo os mais cultos, raras vezes os homens de saber ter um tão permanente esquecimento pelos filhos que o enobrecem. Os descendentes de Lucílio de Albuquerque como admiradores de sua obra artística e de seu exemplo de educador, declaram-se dispostos a oferecer sua colaboração àqueles que se dever organizar a distribuição entre as pessoas abastadas do Estado. Os quadros do grande pintor para as festas do centenário, serão cedidos, certamente, com todo o prazer, por dona Georgina, incansável na dedicação com que cultua a memória do seu esposo. A exposição dos trabalhos de Lucílio de Albuquerque, será facilitada, ainda mais, pelos preparativos em organização para receber as telas de Renoir que o sr. Assis Chateaubriand pretende exibir à Imprensa do Piauí. Para patrocinar a nossa ideia, convidamos o Clube Telepinas, a interessante organização cultural de Teresina, que conta com as figuras de José Olympio de Mello, Ulysses Marques, Carlos Eugênio Poti e Clidenor Freitas Santos, o extraordinário construtor do “Meduna”, que ainda a capacidade do homem se opõe aos mais altos destinos artísticos e culturais, que nos fazem, por vezes, lembrar a figura de Rimbaud, que depois de deixar a língua francesa, dos mais belos poemas dedicou-se a atividades de ordem prática; e a surpreendente colaboração do cientista africano que, renunciando até mesmo a complexas manobras na política internacional aceitou marcar a sua existência com a missão de resistência contra a absorção das massas. É possível que, junto aos idealistas do Clube Telepinas, encontremos o apoio necessário para a realização do nosso intento: divulgar a obra e o exemplo de Lucílio de Albuquerque. O entusiasmo dos seus admiradores e discípulos é suficiente para dar impulso ao nosso projeto e cabe ao povo do Piauí a glória de estimular a iniciativa que se propõe, apenas, a dar expressão à memória de um dos maiores pintores brasileiros. *José Fernandes do Rêgo foi ativo jornalista barrense radicado no Rio, ocupando importante papel na imprensa escrita nas décadas de 1950 e 1960. Publicado originalmente em A Luta, em 3 de agosto de 1952. P.S.: A família barrense Rêgo Fernandes, natural de Barras e radicada no Rio de Janeiro, residiu, próximo à casa do pintor Lucílio de Albuquerque na Capital Federal, sendo Lucílio frequentador da residência do ilustre barrense, segundo relato do historiador e cronista Antenor Rêgo Filho, membro desse grupo familiar.
- Fuga para a Taumaturgo de Azevedo
Capa de Rua Grande de Barras do Marataoã [Chagas Botelho] Quando as águas do Rio Marataoã engordaram, toda acasa ficou em situação de enchente. Naquele instante fluvial, começava o drama da minha família, pois o nosso pedaço de chão estava completamente inundado. Quase todos os pertences, conquistados a duras penas, boiavam incontroláveis sobre a invasora turva e impiedosa. Meus pais juntaram o que puderam para, em seguida, numa trouxa amarrada às pressas, fosse jogada em cima de uma carroça balsâmica. Agora submersa, partimos da Rua Fenelon Castelo Branco em direção a um abrigo providencial. Desabrigados, seguimos banhados de lágrimas e lama. Um velho galpão, com cheiro de secos e molhados, era o nosso novo lar. A residência temporária dos mais recentes alagados da cidade mesopotâmica. Um exíguo espaço cedido pelo seu João Eulálio e a sua esposa dona Léia Eulálio, patrões de minha mãe, uma doméstica simples e dedicada. Seu Joãozinho, como era carinhosamente conhecido, nos amparou com comiseração e de certa forma comovido com a força das enchentes do finalzinho da década de 1970. Chegamos à nova morada, quase sem nada, maltrapilhos. Passei a dormir num único cômodo com meus pais e irmãos. Um amontoado de corpos desolados e entristecidos. Deveria ter lá os meus sete anos de idade. No primeiro dia, ao abrir o portão, que ficava nos fundos da loja do seu Joãozinho (loja que tempos depois virou Armazém Paraíba) me deparei com a rua larga e imponente. Tratava-se da Rua Taumaturgo de Azevedo. Na esquina, ficava a ponta da Praça da Matriz. Defronte ao nosso alento, funcionava o suntuoso prédio da prefeitura. Um pouco à sua direita, a descida para a Prainha que felizmente não transbordara. À direita de nossas instalações, outra descida, aliás, a descida da diversão que desembocava até o balão lá para os rumos da Boa Vista. Desse outro lado das cheias, meu mundo era melhor. Mais feliz. Leia a crônica do comunicador e cronista barrense Chagas Botelho, com memórias da Rua Taumaturgo de Azevedo , publicada na coletânea Rua Grande de Barras do Marataoã, organizada por Dílson Lages Monteiro, com textos para Barras jamais esquecer : CLIQUE AQUI e vá até a página 13. Chagas Botelho é radialista, cronista. Exerce o radialismo há 30 anos, com atuação em alguns dos principais veículos de comunicação do Piauí. Entre suas obras, Delito Intencional (crônicas, editora UICLAP) e Olhar de Casca de Banana, vencedora do concurso de novos autores promovido pela Fundação Cultural Monsenhor Chaves. Natural de Barras-PI. Conheça mais do trabalho de Chagas Botelho em entrevista:
- Os Castello Branco ontem e hoje
Capa de Os Castello Branco Ontem e Hoje de Homero Castello Branco (*) Dílson Lages Monteiro - da Academia Piauiense de Letras Em “Testemunha ocular da história: o uso da imagem como evidência histórica”, obra que se tornou clássica para pesquisadores, Peter Burker afirma: “Nos últimos tempos, os historiadores têm ampliado consideravelmente seus interesses para incluir não apenas eventos políticos, tendências econômicas e estruturas sociais, mas também a história das mentalidades, a história da vida cotidiana, a história da cultura material, a história do corpo etc. Não teria sido possível desenvolver pesquisa nesses campos relativamente novos se eles tivessem se limitado a fontes tradicionais, tais como documentos oficiais produzidos pelas administrações e preservados em seus arquivos” (2017:17). Conclui Burker: “Por essa razão, lança-se mão, cada vez mais, de uma gama mais abrangente de evidências, na qual as imagens têm o seu lugar ao lado de textos literários e testemunhos orais” (2017:17). Tais palavras, embora concentradas enfaticamente no valor da imagem, do texto literário e das narrativas orais como documento, endossam, também, o lugar social da genealogia, ao redimensionar a concepção, segundo a qual, qualquer fonte converte-se em instrumento válido para, não apenas se desdobrar vínculos causais, consequências e cronologia de fatos, mas também, e sobretudo, o modo de pensar de um tempo, referendando Robert Darton, para quem a história traduz uma maneira de pensar. A genealogia significou, historicamente, um dos fortes aliados aos mais diversos campos dos estudos em humanidades. Dela, até hoje historiadores se valem, entretanto, sua utilização passou por novos contornos. Se antes estava a serviço notadamente de perfis biográficos eivados da exaltação de grandes feitos ou a serviço do positivismo, foi, a par de novas metodologias e apropriações, convertendo-se como objeto válido para um entendimento mais exato das relações de poder, como o fez pioneiramente a historiadora Tania Pires de Brandão ao estudar a elite colonial piauiense e, modernamente, entre nós, a seu modo, o historiador e acadêmico Reginaldo Miranda. E mais do que a compreensão das relações de poder, verteu-se em objeto igualmente útil ao entendimento do próprio tecido social em crenças, costumes, valores e outras relações de ordem diversa, capazes de investigar conflitos sociais e identidades dos mais variados grupos. À luz de teorias recentes, a genealogia vem se constituindo como campo de conhecimento para a construção de autoidentidade. Sob essa ótica, o genealogista Gilberto de Abreu Sodré Carvalho explica: “A genealogia não é um assunto de interesse restrito a nobres estabelecidos há algum tempo ou há tempos, de arrivistas ou de genealogistas de jeito fidalgo, mas sim estudo seriíssimo para entender o desejo de poder e de imanência (sermos intrinsicamente especiais) de cada um de nós. O impulso pelo poder – que nos garante, ao menos na aparência sobreviver – estabelece a competição pela ascensão social e a fuga da descensão” (2017:28). A esse propósito, esclarece Sodré Carvalho: “A ausência de memória vinda de genitores, avós e além leva a invenção de um passado, uma vez que o passado real como conhecido é honrosamente vazio, restrito à expressão das mãos, dos olhos, da cor da pele, dos traços do rosto para dar as pistas. Os humanos, de regra, não aceitam de bom grado não terem um passado conhecido que os ajude a desenvolver uma mais completa identidade” (2017:237). Por essa razão, argumenta o genealogista que somos “roteiristas e atores de autobiografias em curso de encenação e ajustes”. *** As duas primeiras décadas do século XXI se desenharam como momento fértil e de surpresas com a publicação de dezenas de obras sobre famílias piauienses e seus entrelaçamentos familiares. Entre as famílias estudadas, poucas receberam atenção tão detalhada quanto os Castello Branco. Em 2008, Dr. Edgardo Pires Ferreira, um dos mais respeitados genealogistas brasileiros, cujo fôlego e vocação para estudos de família legaram um denso conjunto de livros nos quais o Piauí colonial e Imperial e outros estados se fazem representar, lançava o volume 5 de A mística do parentesco – uma genealogia inacabada, publicando tomo específico sobre Os Castello Branco, no qual agrupava mais de 13 mil verbetes. Nessa obra, ele ampliava os esforços dos demais volumes, reinterpretando verbetes por meio de ligações de diversas famílias estudadas aos Castello Branco e aos Carvalho de Almeida, alguns dos pioneiros na colonização do Norte piauiense. Escritor Homero Castello Branco, da Academia Piauiense de Letras, autor de duas dezenas de livros, entre os quais Os Castello Branco Ontem e Hoje. O estudo terminou por resumir os volumes anteriores de A mística do parentesco, cuja edição é 1987, e preencher lacunas, somente descobertas com a circulação dos primeiros cinco volumes da coleção. Por meio do volume específico dos Castello Branco, uma de suas metas era realizar uma releitura de “Apontamentos Genealógicos de Dom Francisco Castello Branco: seus ascendentes e descendentes”, organizada por Antônio Leôncio Ferraz e outros, editada em 1926, hoje rara, livro que a despeito de ter valor incomensurável para a área e seu tempo, exige grande esforço de leitura, muito mais própria aos entendidos no assunto. Ao mesmo tempo, Dr. Edgardo aprimorava mais e mais a metodologia que criou para catalogar verbetes de maneira a que o leitor comum consultasse a obra com relativa facilidade, o que, de fato, tornou-se real. A mística do parentesco é de fácil consulta. A inquietação em contribuir para um trabalho mais próximo possível dos anseios de pesquisador o conduziria a mover-se incansavelmente na descoberta das lacunas do quinto volume. Assim é que novas famílias descendentes dos Castello Branco do Sul ao Norte do Piauí, com ou sem o sobrenome incorporado ao nome, foram se somando a outras já registradas na obra. O resultado disso apareceu com o mais fascinante volume da Coleção. Poucos anos depois da 1ª. Edição do número 5 de A mística do parentesco, os piauienses e maranhenses receberiam a nova edição desse tomo, mais que triplicada de verbetes, reunindo mais de 45 mil nomes, a que se adicionou estudo do historiador Gilberto de Abreu Sodré Carvalho. Na esteira dessas publicações ou concomitantemente a elas, o historiador Valdemir Miranda publicava sobre a mesma família o volume 1 de “Enlaces de famílias”, uma genealogia em construção, com registro de quase 15 mil nomes e relações de parentesco. Ele concentrou a atenção na descendência de Antônio Carvalho de Almeida e Maria Eugênia de Mesquita Castello Branco, estabelecidos à época em região hoje pertencente ao município de Batalha em 1725. Interessava ao pesquisador, especialmente, famílias assentadas notadamente entre os munícipios de Piracuruca, Batalha e Esperantina, embora tenha, inevitavelmente, por força da cadeia de casamentos entre parentes, registrado famílias descendentes do casal em outros municípios. Graças a suas pesquisas, catalogaram-se grupos familiares cujo conhecimento de suas raízes jazia quase exclusivamente na poeira da memória oral. A esses dois estudos, as pesquisas do historiador Reginaldo Miranda, em diversos artigos que investigaram a fundo em fontes primárias não exploradas até então, entre outras questões, Dom Francisco Castello Branco e a história pessoal dele em São Luís do Maranhão, assim como a de outros destacados integrantes dessa família, abriram caminho para novas hipóteses úteis à história, à genealogia e ao memorialismo. Cumpre destacar que todas essas pesquisas se construíram ao tempo em que o genealogista carioca Gilberto Sodré Carvalho investigava em minúcias Os Carvalho de Almeida, família com a qual Os Castello Branco originalmente se consorciam por matrimônio no Piauí, originando uma descendência numerosíssima, aos milhares, descendência da qual muitos dos aqui presentes fazem parte. À margem do fechamento de uma década, quando o tempo vende a ilusão de que pouco ainda apareceria, pelo menos por enquanto, em torno dos estudos sobre essa família pioneira na colonização do Piauí, eis que a vocação do acadêmico Homero Castello Branco Neto ao memorialismo e à genealogia, vocação já expressa em vários livros de mesmo matiz, como “Ecos de Amarante”, surpreende e fascina, mais uma vez, com publicação que mais do que apenas um publicação vale pela obra completa que o é. Não apenas pela utilidade e importância aos interessados no assunto, mas principalmente pelo conjunto dos livros enfeixados em um só livro. Se em digressão me remeto a outras obras sobre Os Castello Branco, relativamente recentes, é, também, para pôr em relevo que algumas delas beberam na fonte da tradição oral, especialmente, recorrendo ao conjunto de textos basilares coligido nos diversos livros, reunidos, agora, em um só volume pelo escritor Homero Castello Branco Neto. Esses estudos, todos eles, completam-se e dialogam (um motiva a leitura do outro naquilo que traz de não sabido ou não revelado, naquilo que organiza ou seleciona sob outro paradigma, ou mesmo naquilo que corrige). *** Em “Fenelon Ferreira Castello Branco”, que se desdobra em duas publicações de feição complementar (uma delas, autoral, e outra, do próprio Fenelon, o biografado) e “Os Castello Branco ontem e hoje”, que condensa 4 outras publicações sobre a família, escritas por antepassados, em momentos diversos do passado, até chegar ao presente representado pela escritura de Homero Neto, genealogia e memorialismo se intercruzam. É possível lê-los separadamente, ao sabor do diletantismo, mas também a partir de percurso cronológico de escrita e edição. Independentemente da estratégia de leitura, conseguem os livros alcançar, para além de elementos da vida privada, a própria história da família Castello Branco e ramificações, por meio de realizações de dezenas de seus filhos ilustrados, cuja trajetória é resumida em notas biográficas. Soube o autor, frise-se, promover distanciamento dos textos reunidos, para que imperasse a voz da ancestralidade e um dos sentidos originais do conjunto da obra, o de promover o legado das antigas gerações, sobremodo. Do conjunto, por dever da satisfação pessoal da leitura, destaco no volume intitulado “Fenelon Ferreira Castello Branco” o telurismo que percorre todas as páginas da biografia, nas quais o amor pela figura do tio-avô se materializa em releitura terna, traduzindo em uma só pessoa tio-avô e neto. Em ambos, pela escritura telúrica, abundam “o amor à família, à terra, aos amigos e aos amores”, entre eles, o carinho desmedido pela antiga Barras do Marataoã, expresso em 4 sonetos intertextuais, escritos em 1925 e há muito absorvidos pelos barrenses em versos lidos e relidos quase como hino, entre eles: Barras Ó formosa cidade sertaneja Transbordante de graças campesinas, Banhadas pelas águas cristalinas Que o rio Marathaoan além despeja. Viva eu perto de ti, ou longe esteja, Com essas tuas delícias me fascinas E já velho revejo-me o traquinas Que brincou, por ali, no adro da igreja, Como recordo o barco à flor das águas! E os canoeiros numa trova antiga, Ao som dos remos, desfiando mágoas! Com essas lembranças minha mente escaldas! Ó ninho azul, ó minha Terra amiga, -- Berço de Thaumaturgo e David Caldas. Destaco ainda, no mesmo volume, a publicação, pela primeira vez, dos manuscritos de Fenelon, sob o título seminal “A cronologia da família Castello Branco”, manuscritos que originaram a clássica publicação de Antônio Leôncio Ferraz e outros, sobre a descendência de Dom Francisco Castello Branco. Embora hoje essas informações estejam disponíveis e desmembradas em diversas releituras, o acesso a essas anotações permite cotejar o que já se escreveu sobre esses grupos familiares e mesmo reparar impropriedades. Nos verbetes de Fenelon, agora publicizados em versão fac-símile, o autor optou por registrar as esposas com o acréscimo do nome dos esposos e não o de solteira, diferentemente do procedimento de boa parte dos genealogistas, o que pode gerar esclarecimentos a pesquisadores ou confrontar informações sobre laços de parentesco, embora a catalogação de Fenelon não obedeça ao rigor e ao aprimoramento da técnica de enumeração dos dias correntes. Em “Os Castello Branco ontem e hoje”, tal qual na biografia de “Fenelon Castello Branco”, a leitura é a da curiosidade que anestesia. Agora, pela transmutação do leitor a tempos e a espaços diversos, tendo como acalanto as velhas raízes rurais. Por isso, o livro tem o cheiro, o sabor, o vento e a visão das percepções do mundo rural e de tempos que somente existem na memória, essa fábrica fascinante de subversão da concretude enfadonha dos dias medidos em horas. Nos diversos apontamentos sobre a família, na teia da saga familiar de registrar para a posterioridade a saga dos tempos idos, Homero Ferreira Castello Branco, Herbert Marathaoan Castello Branco, Moisés Castello Branco Filho e Homero Ferreira Castello Branco Neto transformam-se em única voz, a do cotidiano que é a escrita de si, pretensiosamente interessada em segurar as lembranças nas palmas das mãos e repassá-las, o quanto possível, às novas gerações. Assim, o leitor percorre o lugar social dessa família na história, da casa-grande aos postos de poder do mundo cosmopolita, em variados campos da atuação humana, com um “parêntese” extenso para enumerar a grande quantidade de nomes do grupo familiar integrando a Academia Piauiense de Letras. O leitor, quando além de leitor, emprega a palavra escrita como meio de expressão estética, ou como registro utilitário do tempo e da memória, com ou sem o rigor científico, tem a convicção da excelência de um livro se, diante dele, explode a emoção inesperada e um anseio de posse positiva: “Este livro, eu desejaria tê-lo escrito!” Parabéns, Dr. Homero Castello Branco, este livro, desejaria ter escrito! Nós, seus pares nesta Casa de Lucídio Freitas e A. Tito Filho, desejaríamos tê-lo escrito. O mais a ser dito fica por conta da curiosidade dos leitores. Muito obrigado! (*) Dílson Lages Monteiro é literato e pesquisador, titular da cadeira 21 da Academia Piauiense de Letras Oração proferida em 26.10.2019 na sede da Academia Piauiense de Letras, por ocasião do lançamento de “Os Castello Branco, ontem e hoje” e “Fenelon Castello Branco” (edição conjugada), de autoria de Homero Ferreira Castello Branco Neto. Referências: BURKER, Peter. Testemunha ocular: o uso de imagens como evidência histórica . São Paulo: Unesp, 2017. CARVALHO, Gilberto de Abreu Sodré. Homo genealogicus: gênese e evolução do ser humano socialmente importante. São Paulo: Edição do Autor, 2017. CASTRO, Valdemir Miranda de Castro. Enlaces de família – uma genealogia em construção (volume I). Esperantina-PI: Edição do Autor/EDUFPI, 2014. COSTA, Lena Castello Branco Ferreira da. Arraial e Coronel: dois estudos de história social. Cultrix, São Paulo, 1978. DARNTON, Robert. O grande massacre dos gatos e outros episódios da história cultural francesa. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2017. FERREIRA, Edgardo Pires. Os Castello Branco – a mística do parentesco (volume 5) . São Paulo: Línea B Editora, 2008. ________. Os Castello Branco e seus entrelaçamentos familiares no Piauí e no Maranhão (2ª. edição revista e ampliada) . São Paulo: Abc Editorial, 2013. FERREIRA, Homero Castello Branco. Os Castello Branco ontem e hoje/ Fenelon Ferreira Castello Branco (edição conjugada) . Teresina: Nova Aliança, 2019. MIRANDA, Reginaldo. Capitão Francisco da Cunha e Silva Castello Branco . Disponível em https://www.portalentretextos.com.br/materia/capitao-francisco-da-cunha-e-silva-castelo-branco,12977 > acesso em 25.10.2019.
- Um estudo sobre as influências do vaqueiro e da fé católica na formação do município de Barras-PI
(*)Ana Ligia Torres Correia Lima RESUMO Este trabalho apresenta um estudo sobre as influências do vaqueiro e dos festejos da padroeira na formação do município de Barras, no Estado do Piauí. Objetiva fazer uma análise da construção da sociedade barrense, a partir de aspectos históricos relevantes do povoamento do Piauí, invariavelmente realizado através da inserção do gado como vetor da expansão econômica, social e cultural que culminou com o surgimento das fazendas e currais; processo determinante para Barras se organizar enquanto povoação. Palavras Chave: Vaqueiro. Festejos. Cultura. Gado . INTRODUÇÃO Este trabalho aborda um estudo sobre a influência do vaqueiro e da fé católica na formação dos municípios e tem como objetivo geral fazer uma análise da construção da sociedade barrense. A pesquisa se constrói a partir de aspectos históricos proeminentes do processo de colonização do Piauí, constantemente realizado através da inserção do gado como vetor da expansão econômica, social e cultural que iniciou com o surgimento das fazendas e currais, e avançou enquanto povoação. Nesse estudo, busca-se também compreender como surge à profissão do vaqueiro na região Nordeste e na cultura piauiense. Compete, entretanto, dentro do objetivo geral adotado, como fio condutor deste trabalho, abordar a profissão do vaqueiro no âmbito cultural e sua relevância para o município, dos primórdios de sua rica e festejada história aos dias atuais. Como elemento de destaque na ocupação e desenvolvimento da cidade de Barras, pretende-se abordar a presença do vaqueiro nos festejos de Nossa Senhora da Conceição, padroeira do povo barrense, cuja imagem é associada à procura de uma rês perdida, onde um vaqueiro anônimo teria encontrado a relíquia talhada em madeira, dentro de uma moita de tucunzeiro [1] . Conta à lenda que um vaqueiro, a procura de uma rés desgarrada encontrou uma pequena imagem de Nossa Senhora da Conceição talhada em madeira, dentro de uma moita de tucum, localizada onde hoje está erguida a igreja matriz de Nossa Senhora da Conceição, em Barras. O vaqueiro levou o fato ao conhecimento de seu senhorio, rico fazendeiro, filho da província da Bahia, dono de vasta gleba de terra – Coronel Miguel Carvalho Aguiar – que, como obstinado católico, deu início a construção de uma capela, com a finalidade de homenagear a imagem da santa, encontrada pelo vaqueiro, isto no ano de 1749. Entretanto, o rico coronel faleceu antes do termino da edificação da capela. Com a morte do Coronel Miguel Carvalho Aguiar, o sobrinho e herdeiro Manoel da Cunha Aguiar, sob orientação do Frei Manoel da Penha e do Padre Gabriel Malagrida, deu continuidade a construção da capela, com ajuda de alguns fiéis. ( FILHO 2007 p.35) [2] . Para consolidar uma real relação do vaqueiro com a fundação do município de Barras, é importante colocar em posição de destaque o encontro da imagem da santa citada na narrativa de Antenor Rego, a criação de um cenário lúdico inferido no imaginário popular local, ideal para a criação do mito do vaqueiro em busca do gado perdido e daí surge a capela que dá origem aos festejos da padroeira, atraindo assim populares que iniciam o processo de ocupação no entorno da edificação do templo religioso . A capela tornou-se a base para a formação do núcleo de povoamento, a partir da Fazenda Buritizinho. Naquela época, já existiam algumas casas de telha e várias de palha. Sempre em torno das atividades religiosas. ocorreu o início do processo de urbanização. As primeiras famílias que chegaram as terras que hoje constituem o município de Barras foram oriundas de Pernambuco e da Bahia. Aqui chegaram para fazer morada os Aguiar, os Cunha, os Rabelos, os Correia, os Rodrigues, os Melos, os Castelo Branco, os Carvalho de Almeida, entre outras. Ao introduzir inferência histórica à pesquisa, pretende-se reafirmar que a prática da criação de gado confunde -se com a formação e estruturação da sociedade barrense nos campos político, econômico e cultural. A cidade de Barras, como grande parte das vilas e povoados da época, nasce de um encontro emblemático entre um vaqueiro e a imagem de uma santa, no entorno de uma fazenda, com água e terras suficientes e capazes de suprir as necessidades dos rebanhos, propiciando dessa maneira expansão econômica com a engorda e a facilidade de transporte do gado e o comércio da carne, do couro e de outros derivados, para os principais centros consumidores do país e até mesmo exportando para a Europa. Para alcançar os objetivos da pesquisa, o estudo é constituído metodologicamente de uma pesquisa bibliográfica na qual se recorreu a obras de autores referentes à temática. Nesse sentido, foi importante o embasamento teórico de autores como Rego Filho (2007), Chaves (2013), Abreu (1988), Cunha (1993), Furtado (1963) entre outros. Também uma breve pesquisa junto à Igreja Católica, Paroquia de Nossa Senhora da Conceição pois tradicionalmente o vaqueiro apresenta destaque nas festas da padroeira do município de Barras, tendo um dia de sua novena dedicado exclusivamente para esta figura. Este trabalho visa contribuir para um melhor entendimento acerca da formação do município de Barras, que tem como três pilares fundamentais a fé católica, o rio e a figura do vaqueiro através da pecuária. Desse modo, o trabalho desenvolvido tem a intenção de ressaltar a importância social que o vaqueiro possui na formação deste município e também nas festividades da padroeira. O recorte temporal da pesquisa aborda todo o período histórico do século XVII, início da povoação das terras do Piauí, com a instalação dos primeiros currais e fazendas, aos dias atuais, destacando a fundação de Barras e o vaqueiro como sendo personagem marcante na cultura, religião e símbolo da organização social barrense. Em relação à abordagem que se faz da história local, são mencionados casos relevantes da participação do vaqueiro na formação da sociedade piauiense em geral, em especial na fundação de Barras, na participação das lutas, vitórias e compromissos com atividades de cunho cultural e econômica, além de ações que definem o seu fazer profissional, com um olhar crítico sobre a realidade no entorno da qual o simbologia do vaqueiro surge, como um ser forte e destemido. A discussão e as abordagens inseridas no processo de pesquisa têm origem no quadro qualitativo, vez que a mesma é materializada na abordagem direta da pesquisa com os meios nos quais são colhidas as informações, ou seja, a matéria é extraída de referências bibliográficas e comparadas com as realidades da zona rural e urbanas de Barras, através do olhar cotidiano. Em se tratando da abordagem dada aos fatos históricos, cabe ainda frisar que o contexto citado se espraia do povoamento das terras piauienses e perpassam as datas limites de 1749 e 1804, quando Barras começa ser desbravada e povoada, principiando seu caminho como núcleo social ligado aos coronéis e vaqueiros. É importante frisar que a análise documental e de outras matérias pesquisadas ajudaram no desenvolvimento deste trabalho. Para que os caminhos teóricos fossem encontrados, diante da metodologia proposta, as consultas de campo em conversas informais, colhidas no ambiente local, foram carro-chefe ao entendimento dos fatos atribuídos à importante participação do vaqueiro no desenvolvimento da história da cidade de Barras PI. Ao colocar todas essas passagens históricas na pesquisa, pretende-se reafirmar que a prática da criação de gado se confunde com a própria formação da sociedade piauiense em sua multiplicidade de aspectos. A cidade de Barras PI, como a maioria irrefutável das vilas do período de colonização semeadas em todo o território piauiense, nasce de um processo emblemático, erguendo-se no entorno de uma fazenda com curral, aguadas e terras capazes de suportar os inúmeros rebanhos, propiciando a engorda e a facilidade de transporte da carne, couro e outros derivados para os principais centros consumidores. Para justificar a relação do vaqueiro com o surgimento de Barras é importante salientar a descoberta da imagem de Nossa Senhora da Conceição, dentro de uma moita de tucunzeiro, quando o mesmo campeava uma vaca perdida, cenário ideal para a construção do mito e o levante da capela que, mais tarde, irá motivar os festejos da padroeira, que também será elevada à condição de herdeira direta de todas as terras no entorno da casa grande, num raio de uma légua. O PROCESSO DE POVOAMENTO DO SERTÃO E AS FAZENDAS DE GADO O cotidiano do vaqueiro, personagem principal do nosso trabalho, vive no espaço tradicionalmente conhecido como “sertão”. Segundo Pimentel [3] , o Sertão é abordado sempre com uma ideia de lugar afastado, distante, terra sem lei, local sem recursos, sempre colocado em contraposição ao litoral e à cidade, por visto em oposição à noção de civilidade, o sertão foi sendo assim imaginado e construído, a partir de 1500 até meados de 1930, por boa parte do imaginário popular e pensamento coletivo. O povoamento dos antigos sertões brasileiros durante o período Colonial teve como principal fator econômico a expansão açucareira que foi responsável pela implantação e desenvolvimento da pecuária de subsistência e teve papel importante no fornecimento de alimentos, força motriz e meio de transporte para a sobrevivência dos engenhos de cana de açúcar. Entretanto, essas economias, a pecuária e a açucareira, possuíam características e dinâmicas diferentes. Desse modo, a criação do gado teve de se deslocar das proximidades litorâneas onde se localizavam os engenhos e abrir caminhos para o interior dos sertões, visto que esta atividade era contrária aos interesses dos senhores de engenho e, por conseguinte, da coroa portuguesa, que por uma carta régia coibia a criação do gado a dez léguas da costa. Segundo Capistrano de Abreu: O gado vacum dispensava proximidade da praia, pois as vítimas dos bandeirantes a si próprio transportavam das maiores distâncias e ainda com mais comodidade; dava-se bem nas regiões impróprias ao cultivo da cana, quer pela ingratidão do solo, quer pela pobreza das matas sem as quais as fornalhas não podiam laborar. Pedia pessoal diminuto, sem traquejamento especial, considerando alta valia num país de população rala. Quase abolia capitais, capital fixo e circulante a um tempo, multiplicando-se sem interstício. Fornecia alimentação constante, superior aos mariscos, aos peixes e outros bichos de terra e água, usados na marinha. De tudo pagava-se apenas em sal; forneciam suficiente sal os números barreiros dos sertões (ABREU, 1988p.130) [4] . A pecuária acabou sendo favorecida por esse deslocamento devido a extensão de terras disponíveis e condições para a criação de gado. Essas terras eram conseguidas facilmente, bastava um pedido informal expressando o desejo de ocupação por parte dos posseiros para que a doação das terras acontecesse se formando imensas fazendas de gado. No entanto, a concessão de terras era muito superior à capacidade de exploração. Segundo Mott: [...] deve-se não somente à cobiça dos fazendeiros, desejosos de possuírem grandes glebas, mas também à necessidade inerente à dinâmica da pecuária extensiva que requer áreas de bom tamanho, dado o baixo nível técnico da exploração e a rarefação das pastagens nos períodos de estiagem (MOTT, 1985 p.140) [5] . Mesmo tendo se constituído no período colonial como uma atividade secundária e inicialmente inferior a produção açucareira e a mineração, a pecuária ganhou cada vez mais espaço no cenário social e econômico do Brasil, segundo advoga Sérgio Buarque de Holanda: “A pecuária constituiu, além da mineração, é óbvio a única atividade econômica rendosa para os sertões, pois o gado a si próprio se transportava” [6] . A disponibilidade de mão de obra para o trabalho nas fazendas não enfrentou muitas dificuldades. Era um ramo muito atrativo, sobretudo para aqueles que possuíam poucos recursos, pois o homem que aceitava trabalhar nas fazendas de gado recebia uma cria em quatro nascidas, podendo iniciar a sua própria criação e assim subir socialmente. Além do trabalho no engenho de açúcar, para suprir as necessidades mais básicas da vida cotidiana da população, o gado surge servindo como fonte de renda no comércio local, como ressalta Celso Furtado: O couro substitui quase todas as matérias-primas evidenciando o enorme encarecimento relativo de tudo que não fosse produzido localmente. Esse atrofiamento da economia monetária se acentua na medida em que aumentam as distâncias do litoral, pois dado o custo do transporte do gado, em condições de estancamento do mercado de animais, os criadores mais distantes se tornavam submarginais. Os couros passaram a ser a única fonte de renda monetária destes últimos criadores (FURTADO ,1963 p,133) [7] . Tentando um melhor entendimento dessa abordagem, foi preciso mostrar a realidade vivenciada pelo Estado, antes mesmo da chegada dos colonos, e alguns motivos que levaram homens a abdicarem de suas origens e se aventurar por terras desconhecidas, até então, do sertão piauiense. Importante frisar que quase nada se sabe sobre o Piauí, antecedente ao século XVII, a não ser que em suas terras viviam tribos indígenas que não conheciam os hábitos e os costumes dos colonos, e que isso gerou conflitos de grandes proporções , muitas dessas terras eram copiosas em águas e solos férteis com pastagens propícias à criação extensiva de gado sem muitas intempéries climáticas e a vegetação formada muitas vezes pela caatinga. E é na região norte do Piauí, onde se encontram as terras de Barras, caso deste estudo. Chaves relata: Para a parte norte confina estas com a costa do mar, correndo do Ceará para o Maranhão, para a qual tem dois caminhos, abertos ambos no ano de 95, um vai ao Maranhão e o outro à Serra da Guapaba, à qual tem ido moradores, e em companhia de alguns vieram os Padres da Companhia de Jesus, que nela assistem, fazer missão a esta povoação em o mês de dezembro próximo passado de 96, e se recolheram à serra em janeiro de 97... O documento é datado de 2 de março de 1697(CHAVES, 2013 p.125) [8] . O combate aos nativos, pela Casa da Torre, iniciado em 1674, culminou com o massacre e expulsão dos mesmos, na região do São Francisco, nos limites do sul do território piauiense. A Carta Régia de 1701 é outro fator que influenciou categoricamente na expansão da pecuária em direção ao Piauí, pois por este instrumento a coroa portuguesa determinou que os criadores retirassem os seus rebanhos, no prazo de um mês, para o interior, observando a distância de dez léguas. Essa vontade da metrópole surge como proteção à expansão da economia açucareira, em Pernambuco, e termina influenciando toda a região e entorno que conforme Celso Furtado “teria de acarretar consequências para as demais regiões” [9] . Os detalhes inseridos nesta pesquisa servem para reforçar a tese da expansão bovina em direção aos Sertões de Dentro, como era chamado o incógnito Piauí da época, tendo como resultado a descoberta de áreas mais aprazíveis que possibilitou que alguns fazendeiros com escravos e vaqueiros, construíssem ali seus currais e fazendas, células embrionárias de muitas cidades, como Barras, que surgiu dentro desse contexto histórico, econômico, cultural e social. A política que guiou, naquele período, o uso dos sertões pelos rebanhos de gado e instalação das fazendas é a mesma que vem assegurar o controle dessas terras por parte de ricos proprietários, agora denominados de sesmeiros, pelos governos provinciais, sob o comando da Coroa Portuguesa. Esses domínios territoriais passam então para o poder de uns poucos latifundiários que dispunham dos recursos, não para o desenvolvimento social, agrícola ou quaisquer outras atividades produtivas, mas para serem transformados em pastagens utilizadas para alimentação dos imensos rebanhos. Com essas modificações, surgem os coronéis e o regime político que marca esse sistema na transição entre o Brasil Colonial e o Império. Abordando esse assunto, ainda muito atual e em amplo debate no Piauí, consequentemente em Barras, onde o processo de ocupação não se deu de forma diferente, Barbosa Lima Sobrinho, estudioso e pesquisador renomado da história da colonização nas terras do Piauí, lembra que: Quando se fizer a história territorial do País, sobretudo na região nordestina, há de se verificar: 1) que os domínios reivindicados pelos potentados são muito mais extensos que as necessidades dadas: 2) que foi insignificante a proporção de sesmaria dadas aos povoadores efetivos da terra. Na história do devassamento do Piauí, esses fatos se patentearam de maneira mais precisa do que em qualquer outro episódio da conquista de nosso território. A concessão de sesmarias beneficiava a potentados baianos, nenhum dos quais pensaria em transferir as suas residências para essas paragens quase bravias. Domingos Afonso Mafrense, Julião Afonso Serra, Francisco Dias d’Ávila, Bernardo Pereira Gago, Arcediago Domingos de Oliveira Lima, Catarina Fogaça, Pedro Vieira de Lima, Manuel Ferreira, Manuel de Oliveira Porto não teriam, por certo, nenhuma ideia de morar ou trabalhar nos descobertos do Piauí, como não a teria aquele Garcia d’Ávila Pereira, que em 1684, com quatro ou cinco anos de idade, já se inscrevia como titular de sesmarias nas margens do Gurguéia e do Parnaíba(SOBRINHO,1972 p.141) [10] . O elemento vaqueiro, desde o princípio do processo de colonização, vai ser trabalhado por pesquisadores e estudiosos do assunto como figura singular para o desenvolvimento de um modo geral, do Piauí, e buscando o espaço mais específico desta pesquisa, o município de Barras, observamos que sua atuação dentro do processo transformador do sertão, enquanto agente cuidador de gado e guardador do espaço físico das fazendas, que se reflete na construção da cidadania do povo barrense, através do fortalecimento econômico e cultural. UM BREVE HISTÓRICO DO MUNICÍPIO DE BARRAS Barras está localizada no centro de seis barras de rios e riachos, o que deu origem ao seu topônimo. Segundo Fonseca Neto, “No nordeste brasileiro um dos significados da palavra BARRA diz ser ela a confluência de um rio e riacho. Barras é o seu plural. E é exatamente o que exprime o sugestivo polinômio BARRAS”. [11] ·. Barras localiza-se na bacia hidrográfica do Rio Longá e é banhada também pelo Rio Marataoã, além de vários riachos. Boa parte da cidade está na margem esquerda do Marataoã. Em se tratando de Barras, a fazenda Buritizinho estava situada em zona privilegiada coberta por matas de cocais, muitos buritizais, carnaubais, cerrado e uma pequena quantidade de caatinga, características da transição entre a Amazônia. Conforme estes relatos o fundador da cidade, coronel Miguel Carvalho de Aguiar, baiano de nascimento, saiu da região das barrancas do São Francisco e se arrisca na travessia do sertão, para instalar a sede do seu domínio territorial no vale do Longá, mas especificamente onde este rio encontra-se com o Marataoan, uma área rica de pastagens e solos férteis. A história se mistura com a lenda no momento em que um vaqueiro anônimo encontra a imagem entalhada de Nossa Senhora da Conceição nos arredores da Fazenda Buritizinho e a oferece a seu senhor, um rico fazendeiro, possuidor daquelas terras, baiano Miguel de Carvalho Aguiar, católico por devoção fervorosa decide que esta santa se tornará a padroeira daquele lugar e manda construir em homenagem à santa, uma capela, dentro da fazenda no local onde a imagem foi encontrada. Desse modo. dá-se a importante contribuição do vaqueiro na construção da base religiosa da sociedade barrense. A imagem encontrada e a capela construída vão orientar o desenvolvimento urbano de Barras, inclusive as feitorias rurais. Mais tarde, após o falecimento do coronel Miguel Aguiar, as terras e quase tudo que há em cima destas no tocante aos animais, passam para o domínio da Santa, Antenor Rego Filho nos revela que: Borges Leal assumiu a administração do patrimônio da Santa, em virtude do falecimento de Manoel da Cunha Carvalho, A pintura das portas foi contratada por Borges Leal por cinquenta mil réis. Estava, pois, concluída, em 1806, a capela, iniciando-se, assim, o povoamento. A fazenda Buritizinho dava lugar à “POVOAÇÃO DAS BARRAS”(FILHO, 2007 p.35) [12] . Neste caminho, beirando o mítico e povoando o imaginário popular, a localização da cidade e o seu crescimento, a partir da fundação da capela, deram-se de certo modo, pela influência do vaqueiro, pois a evolução de todo esse processo de urbanização e de todas as coisas que se sucederam à fundação, aconteceram por empenho do vaqueiro, na trabalho incansável para aumentar as riquezas do município, seja nos cuidados com os rebanhos, a produção dos derivados dessas criações e sua procura para comercialização com os principais centros consumidores dos produtos. Foram surgindo pequenos sítios e fazendas menores, tocadas geralmente por vaqueiros que constituíam família e retiravam a parte que lhe cabia como pagamento pelo cuidado da criação, crescendo e contribuindo para diminuir o tamanho dos latifúndios dos grandes proprietários de terras, contribuindo para o aumento populacional, fazendo surgir novas fazendas, diversidade e rotatividade das atividades produtivas, econômicas e sociais. Aos poucos, a povoação ganha características de Vila. Antenor Rego Filho em sua obra Barras Histórias e Saudades aborda um oficio do Presidente da Província do Piauí, de setembro de 1826, onde requere ao Governo Imperial que se fundasse uma Freguesia no local, como também o povoado ali existente fosse elevado à categoria de Vila: A povoação das Barras é formoseada pela natureza com um rio abundante de peixes, que vai lançar suas águas no caudaloso Parnahíba, com grandes matas que compreendem várias feitorias de algodão, mandioca, e outras gêneros, suas madeiras em maior parte são cedros e outros paus de construção além de belos edifícios e boa igreja que fazem digna de melhor sorte. Esta povoação, dista de Campo Maior 16 léguas, porém o seu distrito por essa parte excede a 30, que dificultam aos fazendeiros procurarem os recursos necessários onde existem as autoridades. (FILHO,2007p.36) [13] No ofício registrado pelo historiador, muitas das novas atividades que vão surgindo para complemento de vida, têm no vaqueiro sua inspiração, dado o dinamismo cultural que envolve sua imagem e pelas condições de vida desse sertanejo a partir desse momento histórico. Fé e devoção são elementos essenciais nesse processo formador da identidade local e cultural do povo barrense, pondo a religiosidade como a base que ampara esse começo de unidade, despontada na tradição anual dos festejos da padroeira e outras práticas típicas da região, aprofundadas na simbologia do vaqueiro, enquanto homem simples e defensor da vivencia do campo como um espaço plural e gerador de oportunidades. Ao observar a presença do vaqueiro na formação da sociedade barrense e partindo do objetivo geral deste trabalho, pode-se concluir, que desde o princípio do processo de desbravamento e colonização, sua participação foi fundamental na transformação social, sempre lembrado dos atos religiosos como um agente de atração popular, guardião da verdadeira identidade da cultura do povo, humilde e trabalhador como é o trabalhador do campo. Pode-se afirmar que o vaqueiro é um profissional a serviço do fortalecimento da cultura e da economia local. Este trabalho remete à figura do vaqueiro, na posição de um homem que busca preservar a tradição sertaneja secularmente vinculada ao projeto expansionista do gado em todo território do Piauí, sendo de suma importância para o surgimento em especial de Barras, campo desta pesquisa mas também de outros municípios, enquanto povoação, freguesia, vila e cidade, um lugar encravado em uma região de transição no norte piauiense, banhada por rios e riachos, que busca se fortalecer e preservar cotidianamente os aspectos cultural, social, econômico e político dessa gente. Compreender a importância do vaqueiro, como profissional e agente cultural, no cenário da formação e desenvolvimento do município de Barras, como um dos objetivos específicos da pesquisa, requer mergulhar na histórica façanha do desbravamento e povoamento do território piauiense, como esclarece a historiadora Claudete Dias “O vaqueiro não era um trabalhador comum e o “status” de vaqueiro atraia todos, a maior felicidade consistia em merecer algum dia o título de vaqueiro” [14] Desse modo, é edificado o processo de profissionalização do vaqueiro barrense na formação do município. Além disso é preciso definir que tipo de relação havia entre o vaqueiro e o fazendeiro, quase sempre movida pela cultura da paz, respaldada no princípio da cordialidade e da confiança. Nesse espaço histórico, os valores propagados são os da honestidade e fidelidade de um para com o outro, a quebra da palavra dada, invariavelmente levava à discórdia. O vaqueiro, normalmente assumia o papel de administrador, usando desse direito para comandar as tarefas, sendo o responsável por cuidar dos animais e de todos os homens envolvidos nas tarefas diária com as terras. Ainda é valioso ressaltar que não existia um senso jurídico, como hoje, que regula as relações trabalhistas, entre patão e empregado, pois o trabalho do vaqueiro não era pago com dinheiro, mas como percentual de crias nascidas vivas no rebanho sob seus cuidados, e com acordos formalizados e confiados na palavra dada. Por isso, é que nessas negociatas, a palavra tinha um valor muito grande, enquanto o inverso, como já foi dito, representava um conflito de valores morais, às vezes, políticos e sociais que fazia estremecer e ultrapassar as relações de amizade e laços criados. O VAQUEIRO NOS FESTEJOS DA PADROEIRA DA CIDADE Merece atenção especial, neste trabalho, o modo como a figura do vaqueiro influenciou e continua influenciando a religiosidade do povo barrense. O mito da imagem da padroeira encontrada entre espinhos em uma moita de tucunzeiro atravessa já quase dois séculos e continua a desafiar a própria história que o envolve. Ano após ano, as pessoas são embrulhadas por esse clima de fé, auxiliadas pela lenda na qual o vaqueiro aparece para o povo com a imagem da Imaculada Nossa Senhora da Conceição, a quem é dada o domínio material, espiritual e temporal sobre todas as coisas desta região. O trecho do testamento do coronel Miguel de Carvalho Aguiar, publicado nas páginas da obra de Antenor Rego Filho, é o relato que vem a confirmar essa parte da história de Barras: “... e mais lhe deixou pelo amor de DEUS ESTE MEU SITIO DA CONCEIÇÃO DAS BARRAS, com todas os seus gados vacuns e cavalares que nele se acharem de meu ferro e sinal com todas e mais gado e miúdos, carneiros, cabras, porcos e tudo o mais, como também a metade das peças de prata, casa e mais trastes...”(FILHO,2007 p.47) [15] Todas estas terras e coisas que nela existiam são deixadas em patrimônio à Santa em testemunho da grande devoção do coronel pela padroeira, consagrada a partir da construção da igreja, onde foi guardado o relicário sagrado. A manifestação religiosa dos Festejos no formato cultural que ainda hoje, em parte, é preservado não seria possível sem a ilustre presença do vaqueiro que é um dos personagens centrais dessa festa. Dentre os eventos da programação anual dos festejos alusivos à Padroeira de Barras, Nossa Senhora da Conceição, período que vai do dia 28 de novembro à 8 de dezembro, a missa dos vaqueiros, celebrada na manhã do dia 6, é um dos pontos de maior encontro de fé, da tradição católica enraizadas no local e adotadas por essa gente. Essa celebração da missa do vaqueiro tem origem dúbia, mas é pensamento recorrente, diante da falta de documentos, que a mesma nasceu da necessidade de se homenagear a capacidade desse trabalhador responsável pela ascensão econômica local na lida com a boiada e os fazeres na fazenda. Antes mesmo de o sol raiar, populares no geral, homens, mulheres, crianças e adolescentes, aos poucos invadem as praças e ruas da cidade, alguns vestem gibões, mocó (botas), peitoral e chapéus e em alguns casos alfoges de couro customizados. Dentre os fiéis, é possível distinguir aqueles que trabalham duro sob o sol escaldante do sertão. A procissão tem início e o andor é seguido por uma multidão que entoa hinos em louvor a padroeira, enquanto os vaqueiros acompanham majestosos e solenes em suas montarias, trotando no asfalto ou no paralelepípedo gasto, até o largo da Igreja, onde acontece o ato litúrgico dentro da Matriz. Sobre os Festejos da Padroeira Antenor Rego Filho diz que: Às cinco horas da tarde, é dado inicio ao cortejo. O mastro vai à frente, seguido pelo andor que carrega a imagem de Nossa Senhora da Conceição, acompanhada por enorme multidão. A banda segue tocando músicas sacras, a multidão cantando e rezando(...) O mastro chega à matriz por volta de dezoito horas, sendo recebido por verdadeiras chuvas de fogos de artifícios e foguetes.(FILHO,2027 p.230) [16] O mito da imagem vai se resguardar na realidade histórica e cultural do vaqueiro sempre presente na vida do município, embora seja preciso dizer que, nos festejos, sua presença esteja mais associada a uma representação mais simbólica, já que a maioria dos presentes aparece ao evento apenas na qualidade de guardiões da tradição popular, de uma época distante da verdadeira profissão de campear rebanhos nos campos. Portanto, é legitimo destacar que a presença do vaqueiro ao longo dos anos, nos festejos alusivos á Nossa Senhora da Conceição, culmina com um ato, onde vaqueiros e curiosos se misturam em meio à celebração, formando uma multidão unida apenas pelo ato da fé, no saudosismo do ressurgimento e fortalecimento da profissão quase desaparecida em meio à evolução urbana. CONCLUSÃO Este trabalho permitiu trazer uma análise da presença do vaqueiro na construção da sociedade barrense, a partir do estudo do processo de ocupação do território piauiense ocorrida a partir do século XVII. Nesse período, houve uma intensa campanha pela posse da terra, conflito este envolvendo índios e conquistadores portugueses, que procuravam novas áreas para implantar e expandir a pecuária, já que o governo português no Brasil, visando proteger a rudimentar indústria açucareira no litoral de Pernambuco e Bahia, determina que os rebanhos sejam retirados das regiões produtoras de açúcar e levadas para o interior, a uma distância de dez léguas. Inicia, assim, o processo de ocupação do Piauí pela atividade agropecuária, bem como as relações sociais, culturais e econômicas, dentre as quais o vaqueiro se destaca e é visto quase como um herói pela luta árdua na lida com os rebanhos que correm os sertões do Piauí em todos as direções, contribuindo para a formação de vilas e cidades nos lugares com boa cobertura de água e pastagens férteis para servirem de alimentação aos animais. Nesse contexto, tem origem a fazenda Buritizinho, célula embrionária da cidade de Barras, povoada a partir da chegada do coronel baiano Miguel Carvalho de Aguiar, à região do Vale do Longá. Percebe-se a partir daí que ao encontrar a imagem de uma Santa nos arredores da Fazenda, um vaqueiro anônimo passa a ter uma importância fundamental sobre as pessoas do lugar através de uma lenda que, ao longo dos anos, irá se transformar no ideário religioso de forte apelo sobre a sociedade barrense, com ressonância nos dias atuais. Desse modo, conclui-se que a história do vaqueiro que encontra a imagem de Nossa Senhora da Conceição, em um primeiro momento, nos mostra também a necessidade de entender o ordenamento da profissão dessa figura popular, presente em todos os cantos do Nordeste, nesse cenário especifico da formação do município barrense. O desfecho desse entendimento nos permite avaliar que nas propriedades de Barras, em sua grande maioria, a profissão de vaqueiro, mesmo sem a cobertura legal de hoje, tinha muitos atrativos, pois se tratava de uma classe trabalhadora com um certo privilegio social. Como ocorria em todo território dominado pela pecuária, permitia-se ao vaqueiro ter participação direta no fruto da produção do gado, vez que a cada quatro animais nascidos com vida, um era dado a ele pelo fazendeiro. Nas bibliografias consultadas para a realização deste estudo, constatou-se que essa partilha, ou seja, a divisão dos animais nascidas com pleno vigor físico, se tratava de uma formula primitiva de participação nos lucros da produção. Destaca que é dado ao vaqueiro, enquanto administrador do rebanho sob seus cuidados, nas ocasiões dos partilhamentos, quase sempre, um brinde especial pelo trabalho realizado. Sendo normalmente presenteado com uma rês já velha, mas em bom estado, para que a mesma servisse de alimento para si e seus familiares. A somatória de todas essas coisas descortinadas no cotidiano do vaqueiro barrense deixa transparecer que sua profissão é um tema relevante da discussão sobre sua participação na formação da identidade cultural do povo local. Compreender e assimilar essa importância significa, irremediavelmente, mergulhar na história da evolução social dos barrenses desde o povoamento aos dias atuais. Cabe destacar nas reflexões elencadas que a presença do vaqueiro nos festejos de Nossa Senhora da Conceição acontece entre altos e baixos, já que o dia 06 de dezembro, data da procissão e missa em homenagem a esse trabalhador, tem a participação dos não vaqueiros que, a cada ano, engrossa o rosário de fiéis no evento tido como tradicional. Observa-se, ao longo da pesquisa, que há pontos negativos na compreensão da problemática levantada, dentre estes o fato de que o vaqueiro, aos poucos, vem perdendo sua importância dentro da cadeia produtiva da pecuária local. Esse quadro negativo na economia local se agrava com a saída dos filhos e herdeiros dos proprietários de terras, para estudar em outros centros, muitas vezes não voltando mais às origens, deixando sem opção de continuidade o laço familiar dos coronéis que, sem domínio da tecnologia, perdem muitos dos seus espólios e domínios políticos. Notas [1] Pequena Palmeira espinhosa, cuja as folhasse obtêm uma fibra comprida e forte, semelhante a lã, muito comum na região. [2] 1 REGO FILHO. Antenor. Barras, Histórias e Saudades. EDUFPI, 2007. 246 p. 35. [3] PIMENTEL, Sidney Valadares. O chão é o limite: A festa de Peão de Boiadeiro e a domesticação do Sertão. Editora UFG. Goiás, 1997, [4] ABREU, João Capistrano de. Capítulos de história colonial: 1500 – 1800 & Os caminhos antigos e o povoamento do Brasil. 2ª Ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998, p. 130 [5] MOTT, Luiz R. B. Piauí Colonial: população, economia e sociedade. Teresina, 1985.[projeto Petrônio Portela], p. 140 [6] HOLANDA, Sérgio Buarque de. História Geral da Civilização Brasileira. Tomo I, A. Época Colonial. 2º Volume. Difusão Européia do Livro, São Paulo, 1960, p. 128. [7] FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. Editora Universidade de Brasília, 1963, p. 133. [8] CHAVES, Monsenhor. Obra Completa, Teresina. Fundação Municipal de Cultura Monsenhor Chaves. 2013, p. 125 [9] FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 31ª edição, [1959] 2003, p.60 [10] SOBRINHO. Barbosa Lima. Devassamento do Piauí. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1972, p. 141 [11] FONSECA NETO, Antônio. In: Municípios Turísticos Piauienses – Barras. Teresina: Sebrae, 1996. p. 1719. [12] REGO FILHO. Antenor. Barras, Histórias e Saudades. EDUFPI, 2007, p. 35 [13] REGO FILHO. Antenor. Barras, Histórias e Saudades. EDUFPI, 2007, p. 36 [14] DIAS. Claudete Maria Miranda. Balaios e Bem-Te-Vis: A Guerrilha Sertaneja 2ª edição, Teresina: Instituto Dom Barreto, p. 77 [15] REGO FILHO. Antenor. Barras, Histórias e Saudades. EDUFPI, 2007, p 47 [16] REGO FILHO. Antenor. Barras, Histórias e Saudades. EDUFPI, 2007, p 23 REFERENCIAS ABREU. Capistrano de. Caminhos antigos e povoamento do Brasil. ED. Da Sociedade Capistrano de Abreu. Rio de Janeiro. Briguiet, 1930. ABREU, João Capistrano de. Capítulos de história colonial: 1500 – 1800 & Os caminhos antigos e o povoamento do Brasil. 2ª Ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998. CASCUDO. Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 11ª ed. São Paulo. Global, 2002. CASCUDO. Luís da Câmara. Vaqueiro e Cantadores. (1939). Rio de Janeiro: Ediouro. 2000. CHAVES, Monsenhor. Obra Completa, Teresina. Fundação Municipal de Cultura Monsenhor Chaves. 2013. 639 p. CUNHA. Euclides da. Os Sertões. 12ª edição, p – 118-119. Editoria Francisco Alves, 1993. DIAS. Claudete Maria Miranda. Balaios e Bem-Te-Vis: A Guerrilha Sertaneja 2ª edição, Teresina: Instituto Dom Barreto. 285 p. FONSECA NETO, Antônio. In: Municípios Turísticos Piauienses – Barras. Teresina: Sebrae, 1996. p. 17-19. FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. Editora Universidade de Brasília, 1963, p. 133. HOLANDA, Sérgio Buarque de. História Geral da Civilização Brasileira. Tomo I, A. Época Colonial. 2º Volume. Difusão Européia do Livro, São Paulo, 1960, p. 128. REGO FILHO. Antenor. Barras, Histórias e Saudades. EDUFPI, 2007. GAMEIRO. Alvina. Chico Vaqueiro do meu Piaui. Ed. Henriqueta Galeno. Fortaleza – Ceará, 1971. MOTT. Luiz R. B. Piauí Colonial: população econômica e sociedade. Teresina 1985. (Projeto Petrônio Portela). PIMENTEL, Sidney Valadares. O chão é o limite: A festa de Peão de Boiadeiro e a domesticação do Sertão.Editora UFG. Goiás, 1997. SANTANA. R.N Monteiro (org). Apontamentos para a História Cultural do Piauí. FUNDAPI. Teresina. 2003. 486 p. SOBRINHO. Barbosa Lima. Devassamento do Piauí. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1972
- Águas Livres dos Rodrigues de Carvalho
[*Valdemir Miranda de Castro] - especial para o Museu Virtual de Barras do Marataoã Ao prezado amigo Edgardo Pires Ferreira com a mais sincera estima e admiração. Fundada por volta de 1805, por José Rodrigues de Carvalho, a Fazenda Águas Livres, pertencia a Freguesia de Nossa Senhora do Carmo de Piracuruca. Localizada no atual município de Batalha, tem sua história ligada ao enlace dos Rodrigues de Carvalho com os Pires Ferreira. Os Rodrigues de Carvalho do Piauí têm como ascendentes os irmãos Francisco e Domingos Rodrigues de Carvalho, militares, alferes de Infantaria do exército português, que vieram no início da ocupação portuguesa para a Capitania da Bahia. Este último foi nomeado por alvará em 1674, ao posto de Capitão pelo Visconde de Barbacena, governador geral do Brasil (PEREIRA DA COSTA, 1974, p. 43-4). Francisco, e seu irmão, comandante da companhia integraram a expedição de Francisco Dias de Ávila em incursões aos sertões do Piauí. José Rodrigues de Carvalho era irmão Joaquim Rodrigues de Carvalho e Amaro Rodrigues de Carvalho. Joaquim foi casado com Isabel Barbosa e pais de: Paulo, Prudente, Manoel, Antônio e Josefina Tereza de Jesus, todos Rodrigues de Carvalho (CASTRO, 2014, 449). [v. Fazenda Conservador]. José Rodrigues de Carvalho foi casado com Maria Tereza de Jesus, ela é muito provável que descenda dos Carvalho de Almeida, infelizmente, por falta de registro dos sobrenomes das mulheres, não podemos precisar seus pais, porém em vários registros eclesiásticos, encontramos seu nome ligado aos descendentes dos Carvalho de Almeida, sendo madrinhas de vários de seus sobrinhos e tendo uma filha como afilhada dos Carvalho de Almeida. Encontramos no livro de batismo de Piracuruca que em 08.11.1806, no lugar Saco de São Francisco, Freguesia de Piracuruca o pároco da freguesia batizou a CLARINDA, filha de José Rodrigues e Carvalho e Maria Tereza de Jesus, nascida a nove de outubro do mesmo ano, tendo como padrinho: Francisco Carvalho de Almeida e Maria de Jesus. José Rodrigues de Carvalho e Maria Tereza de Jesus foram pais dentre outros filhos de: Clarinda Maria de Jesus, Lina Carlota de Jesus e Carlota Lina de Jesus [Rodrigues de Carvalho]. De Clarinda já nos reportamos e veja mais informações sobre ela quando falarmos da Fazenda Beiru. Quanto a Lina Carlota de Jesus nasceu a 01.12.1811, na Fazenda Águas Livres, Freguesia de Nossa Senhora do Carmo de Piracuruca. Foi batizada a 04.01.1812 na Matriz de Nossa Senhora do Carmo, pelo padre José Remígio Ferreira. Foram seus padrinhos: o capitão Francisco Félix Narciso Castelo Branco e sua mulher dona Lina Maria de Jesus. Casou-se a 15.11.1825 na fazenda Águas Livres, no município de Batalha com Comendador Antônio Pires Ferreira que nasceu a 12.02.1799 no sítio Santo Agostinho, província do Maranhão depois Município de São Bernardo, atual Magalhães de Almeida e faleceu a 23.11.1877 no Engenho Paraíso, Município de São Bernardo no Maranhão. Filho de José Pires Ferreira e Marina de Deus Castro Diniz. O casal foi pai de dezenove filhos: Rosa Pires Ferreira, Angélica Pires Ferreira, José Pires Ferreira, Cassiana Lina Pires Ferreira, Carlota Lina Pires Ferreira, João de Deus Pires Ferreira, Columba Pires Ferreira, Antonio Pires Ferreira Filho, Carolina Pires Ferreira, Fernando Pires Ferreira, Maria de Deus Pires Ferreira, João de Deus Pires Ferreira, Manoel Pires Ferreira, Ana Lina Pires Ferreira, Manoel Pires Ferreira, José Pires Ferreira, Eulália Pires Ferreira, Lina Pires Ferreira. (PIRES FERREIRA, 1990, V. 4, p. 18 a 165]. Lina Carlota de Jesus faleceu a 06.08.1883 no Engenho Paraíso, sendo sepultada no cemitério velho da cidade de São Bernardo (MA). Sobre sua morte encontramos o seguinte registro: "No dia 06 do corrente... faleceu no seu Sítio Paraíso, no termo de São Bernardo, da Província do Maranhão, na idade de 73 anos, a exma. sra. d. LINA CARLOTA DE JESUS PIRES, viúva do comendador ANTONIO PIRES FERREIRA - é mãe do nosso prezado amigo dr. FERNANDO PIRES FERREIRA. Era a ilustre finada senhora de peregrinas virtudes, entre as quais sobressaia a de caridade, que cultivou com esmero despretensioso durante sua longa passagem por sobre a terra. Pertencia a uma das famílias mais distintas desta província, tornou-se mãe de numerosa prole, sobre quem exercia bem pronunciada e benéfica influência, já pela sua idade e já pelo prestigio de sua amável e venerada conduta em relação a quantos de si descendiam. “Aos nossos prezados amigos FERNADO PIRES FERREIRA, tenente JOSÉ FLORINDO DE CASTRO, FRANCISCO FLORINDO DE CASTRO, que a idolatravam e vos de mais parentes da ilustre finada, apresentamos as nossas condolências" JORNAL "A ÉPOCA", Teresina, ANO VII, Nº 318 de 23.08.1884, p.4. As famílias endogâmicas, tinham vários enlaces entre os primos. Duas filhas do Comendador Antonio Pires Ferreira e Lina, Cassiana e Carlota, se casaram com dois irmãos, José e Manoel Rodrigues de Carvalho, filhos de José Rodrigues de Sampaio [primeiro do nome] e de Josefina Tereza de Jesus, esta irmã de José Rodrigues de Carvalho. Cassiana Lina Pires Ferreira, nasceu em 1832 na Parnaíba e faleceu em Buriti dos Lopes. Foi batizada em 27.11.1832 na matriz de Parnaíba. Casou-se em 1851 no Engenho Paraíso com seu primo segundo, JOSÉ RODRIGUES DE SAMPAIO, [segundo do nome], Fazendeiro em Buriti dos Lopes. Coronel da Guarda Nacional. Filho de José Rodrigues de Sampaio [primeiro do nome] e Josefina Teresa de Jesus [Rodrigues de Carvalho]. Neto materno de Joaquim Rodrigues de Carvalho e Isabel Barbosa. Foram pais de: José Pires Sampaio, Antonio de Sampaio Pires Ferreira, Fernando Pires Sampaio, Lina Cassiana Pires de Sampaio, Frederico Pires de Sampaio, João Pires de Sampaio. (PIRES FERREIRA, 1990, V. 4, p. 20-30]. Carlota Lina Pires Ferreira, nasceu a 17.11.1833 em Parnaíba e faleceu a 30.08.1884 na Fazenda Bacuri, no município de Buriti dos Lopes. Casou-se em 1855 no Engenho Paraíso com MANOEL RODRIGUES DE SAMPAIO [MANO] nasceu a 18.12.1830 e faleceu 31.12.1877 na Fazenda Bacuri. Filho de José Rodrigues de Sampaio e Josefina Teresa de Jesus [Rodrigues de Carvalho]. Neto materno de Joaquim Rodrigues de Carvalho e Isabel Barbosa. Foram pais de: Lina Josefina Pires de Sampaio, Josefina Lina Pires de Sampaio, Carolina Pires de Sampaio, Cassiana Carolina Pires de Sampaio, Manoel Pires de Sampaio, Gervásio Pires de Sampaio, Antonio Pires de Sampaio (PIRES FERREIRA, 1990, V. 4, p. 31-44). Quanto à terceira filha, Carlota Maria de Jesus, nasceu por volta de 1808 na fazenda Águas Livres, no Município de Batalha e faleceu em 1847 na Vila de Piracuruca. Casou-se com FRANCISCO FLORINDO DE SOUSA CASTRO, [primeiras núpcias deste], nasceu 1810, no termo de Batalha, foi batizado a 11.10.1810, na Capela de Batalha, Freguesia de Nossa Senhora do Carmo de Piracuruca, pelo Pe. Domingos Dias Pinheiro, tendo como Padrinhos: Leonardo de Carvalho Castelo Branco e Ana Rosa Clara Castelo Branco (Livro de Batismo de Piracuruca de 1810); faleceu em 1887 na Vila de Batalha. Tenente da Guarda Nacional na Vila de Parnaíba. Dirigiu, em 19.06.1839, correspondência ao presidente da Província do Ceará, João Antonio de Miranda, pedindo socorro militar para Parnaíba, durante a Balaiada. (Revista do Instituto do Ceará, doc. 03, p. 255). Coronel Chefe da Legião da Guarda Nacional de Piracuruca, em 15.05.1846. (CASTRO, 2014, p. 216, 452). Foram pais de: Auta Inês de Castro [terceira do nome], José Florindo de Castro e Francisco Florindo de Sousa Castro [segundo do nome]. Francisco Florindo de Sousa Castro casou-se em segundas núpcias com ANGÉLICA AGOSTINHA DE ARAÚJO CASTRO, n. e f. em Batalha. Descendem do casal: Viriato Doriano de Araújo Castro, Doriano de Sousa Castro, Maria Madalena de Castro [Miranda] e Clementino Gomes de Castro. Auta Inês de Castro [terceira do nome] foi casada com o Capitão Jerônimo Gomes da Silva Rebelo, nascido em 1819 em Campo Maior e falecido em Batalha. Filho de José Gomes Rebelo e Umbelina Francisca do Rosário. Neto materno de José Carvalho de Almeida e de Francisca Castelo Branco (CASTRO, 2014, p. 229). José Florindo de Castro, nasceu em 1830 em Parnaíba e faleceu em Batalha, foi Tenente-coronel Comandante do Batalha da Guarda Nacional em Batalha. Primeiro Intendente da Vila de Batalha. Deputado a Assembleia Provincial na 21ª legislatura de 1876 a 1877, foi casado com Ignês Maria da Silva Castro, deixando vários descendentes em Batalha entre eles: Brígida, Marcolino, Cotinha, Carlotina, Lina, Inês, Castro Filho, Fernando e Rosa Inês de Castro. Francisco Florindo de Sousa Castro [segundo do nome], nasceu em 15.08.1838, em Buriti dos Lopes e ali faleceu a 18.06.1916, e ali foi sepultado. Tenente-coronel da Guarda Nacional. Casou-se a 07.01.1865, no Engenho Paraíso no Maranhão com sua prima materna, Ana Lina Pires Ferreira, nasceu a 01.08.1847, no Engenho Paraíso e faleceu em 22.05.1880 no Maranhão. Filha de Comendador Antônio Pires Ferreira e Lina Carlota de Jesus Rodrigues de Carvalho. Francisco Florindo de Sousa Castro casou-se, em segundas núpcias, a 29.12.1881, na Fazenda Bacuri, Município de Buriti dos Lopes, com a sobrinha de sua primeira esposa, CASSIANA CAROLINA PIRES DE SAMPAIO [Dona], nasceu a 15.06.1860, na Fazenda Bacuri, e faleceu a 24.03.1935, em Parnaíba. Filha de Carlota Lina Pires Ferreira (esta, irmã de Ana Lina Pires Ferreira) e de Manoel Rodrigues de Sampaio [Mano]. (PIRES FERREIRA, 1990, V. 4, p. 129 a 159). Maria Madalena de Castro Miranda, foi casada com Antônio Guilherme Machado de Miranda, filho de José Amaro Machado e Ana Francisca de Miranda. Neto materno Francisco José Rodrigues e de Maria Rosa de Miranda. Bisneto materno do Cel. José de Miranda e Ana Maria de Mesquita. Trineto materno de Capitão Antônio Carvalho de Almeida e Maria Eugênia de Mesquita Castelo Branco (CASTRO, 2014, p. 224). Águas Livres passou a família Quaresma de Melo, sendo adquirida por Salvador Quaresma Dourado de Melo, nascido em Piracuruca e falecido no termo de Batalha. Casado que foi com Idalina Rosa de Melo, filha de Diógenes Benício de Melo e Geracinda Rosa de Melo. Esta neta materna de Onofre José de Melo e Cecília Maria das Virgens, naturais de Pernambuco, fundadores da Casa do Desterro, na Freguesia de Piracuruca. Salvador Quaresma Dourado de Melo e Idalina Rosa de Melo foram pais de: Pussina Rosa de Melo, nascida em 1886 em Águas Livres. Casou-se civilmente em 08.01.1807 aos 21 anos com Joaquim José de Melo, nascido em 1886, morador do lugar “A Mais Tempo” em Barras, filho de Prestetato José de Melo e de Georgina Quaresma de Melo. Neto materno de Miguel Quaresma Dourado, nascido em 1817, irmão de Agostinho Quaresma Dourado, casado com Eduarda Francisca Castelo Branco, moradores da Fazenda Palmeira na Freguesia de Piracuruca. Atualmente Águas Livres é propriedade dos herdeiros de Matias Quaresma de Melo, nascido a 29.10.1891 em Batalha e falecido a 03.03.1963 em Batalha. Casou-se em três núpcias, sendo as terceiras com Saturnina Braga de Melo, nascida a 22.03.1928 e falecida a 14.04.1998. Valdemir Miranda de Castro é professor e bacharel em direito, atualmente é secretário da Educação em Esperantina-PI, sua terra natal. Contato: 86 9952-0051
- José Fernandes do Rêgo e a pergunta de abril
[Dílson Lages Monteiro - curador do Museu Virtual de Barras do Marataoã] Em abril, postamos aqui a imagem de um barrense de bonita trajetória, cujo empenho e talento às causas que abraçou o dignificaram como ser de expressão. Então, pedíamos que ele fosse identificado a partir de sua foto, com algumas breves pistas de sua história profissional. As respostas que nos chegaram por e-mail não foram capazes de nominá-lo. Vamos a resposta final: ele nasceu em Barras, em 1923 , e faleceu no Rio de Janeiro, em 1980 . Filho de Antenor de Castro Rêgo e Zila Fernandes do Rêgo, registra o historiador e antologista Wílson Carvalho Gonçalves: José Fernandes do Rêgo (1923-1980). Foto O Dia "Formado pela Faculdade Nacional de Veterinária, Zoologista. Naturalista. Professor de Cultura Técnica da Universidade Federal do Brasil" (2006:161). Mas foi o jornalismo que o celebrizou, escrevendo tanto em jornais do Rio de Janeiro, quanto na imprensa piauiense. Diz ainda Wilson Gonçalves, em Chão de Estrelas da história de Barras: "Jornalista combativo, vigoroso e articulista político de muita sensibilidade. Mantinha uma atuação de combate ao movimento revolucionário de 1964, que lhe valeu a prisão e torturas. Teve passagem marcante na imprensa nacional, cujos trabalhos eram escritos numa linguagem crítica e mordaz. No Piauí, militou nos jornais O Dia, Diário do Povo e no A Luta. Atuou como articulista do Diário de Notícias e Correio da Manhã, ambos órgãos da imprensa carioca. Na administração pública exerceu importantes cargos: assessor do Ministro da Agricultura (1962-1964) e superintendente do Zoológico do Rio de Janeiro" (ibidem). Um passeio pelo jornais das décadas de 1950 e 1960, sobretudo, despertará atenção para seu nome e a colaboração regular e substancial de José Fernandes do Rêgo.. Um estudo detalhado da escritura dele revela grande interesse pelas questões sociais de seu tempo, com foco nos causas coletivas e demandas do Piauí, do Brasil e do Mundo. Em nota, o Jornal do Piauí, em 23.08.1953, informa e parabeniza sobre importante artigo do jornalista sobre O Babaçu no Boletim de Expansão Comercial do Brasil em Nova York: Jornal do Piauí, em 23.08.1953 Trabalho sobre o Babaçu O Boletim do Escritório de Expansão Comercial do Brasil, em New York, número de junho, transcreveu, em inglês, oportuno artigo sôbre a importância econômica do babaçu, escrito pelo jornalista piauiense José Fernandes do Rêgo. Ao jovem conterrâneo, que já se tem projetado com inteligência, na imprensa carioca, enviamos cumprimentos pelo merecido destaque. Jornal do Piauí, em 23.08.1953 Este Museu Virtual catalogou um número significativo de publicações de José Fernandes, tanto publicadas no Rio de Janeiro como no Piauí. Para que o leitor tenha uma visão do que ele escreveu e como escrevia, selecionamos artigo que, passados 80 anos, continua atual. Nele, José Fernandes desperta reflexões para a importância de descentralizar os investimentos em áreas menos desenvolvidas, então, como o Piauí, aludindo ao lugar na história do Estado de dois paulistas: Domingos Jorge Velho, para alguns desbravador das conquistas portuguesas, para outros um facínora que trucidou tribos indígenas pela ganância do vil metal; e o naturalista Francisco Igresias, que registrou a fauna e flora da gente piauiense, legando obra de valor para a sociologia e para a história. Ei-lo em versão original e em transcrita. O Dia, 20.11.1953 DOIS PIONEIROS PAULISTAS J. Fernandes do Rêgo QUANDO, em meados do século XVII, as contingências econômicas e as necessidades de defesa militar impuseram o descobrimento do caminho por terra para o Maranhão, coube ao paulista Domingos Jorge Velho revelar ao Brasil as novas terras que constituem, hoje, o Estado do Piauí. Passados três séculos, outro paulista, Francisco de Assis Iglésias, tão distinto daquele famoso bandeirante, na indumentária e nos instrumentos que maneja, pois se apresentou no cenário piauiense com uma seringa hipodérmica, com seu bisturi de tanderemista, uma caixa de quinino e com seu lápis e caderno anotando e fazendo a sistemática das plantas e dos animais, chama de novo, a atenção do Brasil para o distante Piauí, publicando, na "Brasiliana", um interessante trabalho intitulado "Caatingas e Chapadas", onde a flora, a fauna e os problemas piauienses são analisados com critério e sabedoria. Os dois ilustres paulistas que, em épocas tão distintas aparecem no "hinterland" piauiense tinham objetivos muito diversos: Jorge Velho era o bandeirante avassalador, já celebrado em Palmares, — subjugador de homens com o seu laço e o seu trabuco, conquistador de sesmarias, cheio de audácia e de bravura na busca da fortuna; o doutor Francisco Iglésias, um jovem homem de ciência que visitou o nosso Estado com o objetivo de pesquisar — lhe a flora e a fauna, de conhecer as reservas minerais e as possibilidades econômicas e sociais, de interessar as autoridades e o meio aligado, apresentando sugestões úteis, de recomendar experiências fecundas, enfim, de contribuir com sua força de idealista e de técnico para o bem estar e progresso do nosso povo. Entre ambos, se bem que distintos na forma de pensar e de agir, há, entretanto, um elo de ligação: a sua condição de pioneiros; o primeiro, como desbravador de um caminho novo, o segundo como um guia certo de novas trilhas; o primeiro, como homem que veio abrir, pelo fogo e pelo sangue, a picada das entradas e bandeiras, o segundo como missionário que veio despertar o sertanejo para a esperança de uma vida melhor e para a luta construtiva que conduz à prosperidade e ao bem estar. Ambos vieram, portanto, do Sul do País. Ambos são filhos de São Paulo. Ambos acorreram a este Nordeste abandonado, em busca do seu melhoramento e fortuna; o cientista, procurando realizar obra duradoura de estudo e de pesquisa, e de abertura de novos rumos para a técnica e a civilização brasileiras nas áridas, porém férteis e ricas, terras nordestinas. A sociedade piauiense, por iniciativa do "Clube Teatral 4 de Setembro" e do "Diário do Piauí" e sob a direção entusiasta de Erivaldo Borges, soube reconhecer o valor do gesto do técnico paulista, promovendo uma semana de palestras, de debates, de exames e de meditação em torno da mensagem contida no seu livro e das sugestões dele emanadas. Desse gesto, resultará, por certo, uma fecunda sementeira de melhoramento e de progresso. E, ainda uma vez, São Paulo veio ao Piauí, não pela espada de um guerreiro, mas pelo cérebro de um técnico; não pelo fogo e pelo sangue, mas pela inteligência e pela razão. Não quero terminar estas ligeiras divagações que me cabe fazer sôbre o trabalho do doutor Iglésias e sôbre a obra do bandeirante Domingos Jorge Velho sem dizer que ambos nos são caros. Um, pela descoberta e desbravamento desta região, violenta, difícil, porém cheia de possibilidades econômicas e sociais; o outro, pela propaganda de suas riquezas, pela exaltação das suas belezas naturais, pela análise de seus problemas e pela sugestão de soluções técnicas, que nos sirvam de roteiro no caminho da evolução e do progresso. Ambos, aliás, são dignos do nosso respeito e da nossa gratidão. Ambos, com suas atitudes distintas, significam, para o Piauí, o mesmo Damasco lendário do Apóstolo. Um e outro vieram revelar-nos, de maneira diversa, o caminho de Damasco. O Dia, 20.11.1953 José Fernandes do Rêgo, um barrense de todos os tempos, neste Museu Virtual de Barras do Marataoã.
- Crônica de Frederico Rebelo: "O Coronel que teimou com o Sapo"
(*) Frederico Antônio Rebelo Torres Na vastidão das matas piauienses, nos idos anos de 1902, onde o tempo parecia escorrer lentamente entre os galhos retorcidos das árvores e o canto dos pássaros se confundia com o sussurro do vento, vivia o Coronel Antônio Gomes Rebello. Homem de posses e prestígio, filho de Laurentino Gomes Rebello e Maria Madalena da Paz Borges Leal, era conhecido, ele e sua família, por sua teimosia inabalável e por manter a palavra com a rigidez de um contrato selado em sangue. Casado com a bela Idalina Frederica de Jesus Rodrigues dos Santos, mulher de fibra e fé, filha do poderoso casal Capitão Frederico José Rodrigues e Anna Joaquina de Jesus, o Coronel Antonio levava uma vida regrada na Fazenda Bacuri, situada entre as localidades de União e Barras. A propriedade, embora próspera, era isolada, e os recursos médicos escassos. Túmulo de Laurentina Maria da Paz Borges Leal Rego, irmã do coronel Antônio Rebelo. Cemitério de Miguel Alves. Fonte: parentesco.com.br Acervo de Torquato Torres. Certa noite, durante o rigoroso inverno nordestino, Idalina Frederica entrou em trabalho de parto. As chuvas incessantes transformavam os caminhos em trilhas lamacentas, e os trovões pareciam anunciar presságios. Preocupado com a saúde da esposa e do filho que estava por vir, o Coronel decidiu buscar ajuda na cidade deixando sua amada aos cuidados de sua irmã Laurentina Maria da Paz Gomes Rebello. Montado em seu fiel cavalo, Trovão, partiu sob a tempestade, enfrentando as veredas alagadas e os ventos cortantes. Enquanto avançava, seus pensamentos se voltavam para o compadre, que deveria ter providenciado uma segunda parteira. Em meio à escuridão, sozinho e montado no cavalo questionou em voz alta: — Será que o compadre foi? Nesse instante, um coaxar distinto rompeu o silêncio: — Foi-não-foi. Surpreso, o Coronel parou. O som parecia vir de um sapo oculto nas sombras. — Foi ou não foi? — Foi-não-foi. A teimosia do Coronel foi posta à prova por aquele anfíbio insolente. Sentindo-se desafiado, desceu do cavalo e, armado com seu alfanje, adentrou a lagoa em busca do sapo. A noite avançava, e o Coronel, imerso na água fria, cortava as ramagens, determinado a encontrar o provocador. Ao amanhecer, os trabalhadores da fazenda o encontraram exausto, ainda na lagoa, murmurando para si mesmo. Levaram-no de volta à casa, onde soube que Idalina Frederica havia dado à luz a um menino saudável, Frederico Rodrigues Rebello. O Coronel, porém, passou dias recolhido, abatido não pela febre, mas pela humilhação de ter sido vencido por um sapo. Desde então, evitava falar sobre aquela noite, e os moradores da região, em sussurros, contavam a história do homem que desafiou a natureza e foi derrotado por sua própria teimosia. (*) Frederico A. Rebelo Torres, escritor, membro de diversas instituições culturais, entre as quais, União Brasileira de Escritores. Alval e Academia Miguelavense de Letras, da qual é presidente.
- 21 de junho: Osmália Lira lança
Lançamento acontece em 21 de junho, às 19h, no Auditório Monsenhor Lindolfo Uchoa . Capa de pelos Caminhos da Vida, de Osmália Lira. Evento é uma organização do Coletivo de Leituras Barras do Marataoã, da SEMED E SECULT BARRAS.
- Elmar Carvalho: Barras das 7 Barras
Poema de Elmar Carvalho, da Academia Piauiense de Letras e da Academia de Letras do Vale do Longá .